Um olhar sobre o cinema francês



Mais de uma vez já ousaram me dizer: “você precisa voltar ao mundo real, esquecer o cinema, parar de fantasiar, a vida não é um filme”. Relevo quando tais indagações partem de pessoas sem nenhum conhecimento profundo do meu “eu”, pois mostra desconhecer totalmente minh‘alma, meu ser, meu interior, meu íntimo.

Lembrei-me disso por conta de um filme francês, distribuído pela Gaumont. A lendária companhia cinematográfica francesa está completando 120 anos de existência e comemorando com uma exposição sobre os seus filmes, na capital parisiense, que presenciei (e curti muito) durante minha recente ida ao país (por conta também do Festival de Cannes, na Côte D'Azur). 


























As películas da Gaumont (na exposição comemorativa, abaixo, divididas por décadas) já foram premiadas em vários festivais de cinema, como a “Palma de Ouro” em Cannes, o prêmio “César” da Academia de Artes e Técnicas do Cinema, em Paris, além de outros, dentro e fora da França (inclusive com o famoso “Oscar” americano).



O filme em questão é “Splendor” que conta a história de um homem cuja vida é o cinema, que (como eu) sonha como nos filmes, e espera por um milagre que impeça que a sua sala de projeção não feche, como todas à sua volta (com a chegada dos videocassetes), na década de 80.

“Splendor” é um filme francês de 1989, dirigido pelo (perfeccionista) italiano Ettore Scola (dos também excelentes “Nós que nos amávamos tanto”, “O jantar” e “O baile”) e os mesmos anseios e angústias pelo “fim do cinema” tem Marcello Mastroianni como o protagonista do filme, assim como também vemos no premiadíssimo, eterno e etéreo “Cinema Paradiso” (produzido e lançado na Itália praticamente nessa mesma época). Tanto em “Cinema Paradiso” como também em “Splendor”, tudo é magia do início ao fim; é muito mais que cinema, é o próprio sonho. 




Assim como todo cinéfilo, também o cineasta é um sonhador, vive e respira cinema, não dá para separar as coisas; e questionar o estilo de vida de um cinéfilo/cineasta, um apaixonado pela sétima arte, é jamais entender o nosso íntimo (e, como nos questionam, nós também nos perguntamos como as pessoas podem viver alheias ao fascínio do cinema...). Para nós, o cinema é a indústria dos sonhos, iluminados e projetados numa imensa tela branca.

O grande cineasta sueco Ingmar Bergman deixou escrito: “Cinema é como um sonho, como uma música. Nenhuma arte perpassa a nossa consciência da forma como um filme faz: vai diretamente até nossos sentimentos, atingindo a profundidade dos quartos obscuros de nossa alma”.

E o diretor húngaro István Szabó (de “Mephisto e “Sunshine”) disse: “o cinema é a única arte que consegue captar e registrar para sempre, em imagens eternas, o rosto, os olhos e as expressões humanas... é como escrever com a câmara”.

E, aproveitando “o aniversário” da indústria francesa, foco o (meu) olhar no mais recente sucesso da Gaumont, “Intocáveis” (“Intouchables”), de 2012, que conta a divertida e emotiva história do tetraplégico ricaço (o ator François Cluzet) que resolve contratar um jovem negro problemático (o ótimo ator Omar Sy ganhou o prêmio “César” de 2015) como seu assistente, para auxiliá-lo em sua especial condição de deficiente físico. Imperdível.



Em tempo: apesar de ter ficado fora da competição do Oscar de 2013 (o que foi considerada uma verdadeira injustiça), já existe um “ti-ti-ti” em torno do filme, em matéria de um futuro remake norte-americano (com certeza, ficará aquém do filme francês, mas a poderosa propaganda estadunidense pode surpreender a bilheteria...vamos aguardar...), mas superar a empolgante cena do charmoso ator dançando divinamente vai ser difícil...(eu, como eterna brincante e dançante”, amei a cena, pois tal qual o personagem, também adoro inaugurar salão de festas, se depender de mim, ninguém fica parado).


Também da Gaumont, sob a direção do roteirista francês Luc Besson, “O profissional” (título original “Léon”), dos anos 90, reúne o excelente ator francês Jean Reno (um matador de aluguel) e o magnífico ator Gary Oldman (na pele de um policial corrupto) que contracenam com a ainda menina Natalie Portman (de “V de vingança”,  “Closer, perto demais e Cisne Negro) num ótimo filme que mistura muita adrenalina, tráfico de drogas e corrupção policial, amenizados apenas pela bela música de Sting, Shape of my heart


Em tempo: os óculos estilo John Lennon” e o casaco original do profissional Léon (onde ele escondia o seu arsenal de armas), além das vestes da então menina Natalie Portman, estão em exposição na amostra dos 120 anos da Gaumont, uma verdadeira pérola para os cinéfilos de plantão.


Luc Besson e Jean Reno já tinham trabalhado juntos, na década de 80, no belo “Imensidão azul” (“Le Grand bleu”), também distribuído pela Gaumont, na envolvente história dos dois mergulhadores amigos e rivais ao mesmo tempo, ao som da bela trilha sonora instrumental assinada pelo compositor francês Éric Serra, num belo cenário mar aberto. Magistral.



Outro filme de Luc Besson distribuído pela Gaumont foi “O quinto elemento”, ficção científica com Bruce Willis, Milla Jovovich e Gary Oldman que mistura mistérios e segredos milenares do Antigo Egito com avanços tecnológicos do século 23, onde a história se passa. Um motorista de táxi se envolve numa trama apocalíptica, uma ameaça vinda de outra dimensão capaz de destruir a Terra, e o elo de energia capaz de salvar o planeta seria o tal quinto elemento. 



Também de Luc Besson, a norte-americana Milla Jovovich é a segunda mais famosa “Jeanne d’Arc”, de 1999, no papel da figura mítica que se transformou a jovem e santificada heroína da França, na “Guerra dos cem anos” contra a Inglaterra. Mas a primeiríssima Joana D'Arc” mais famosa do cinema foi a sueca Ingrid Bergman (também o par romântico de Humphrey Bogart no Oscarizado filme dos anos 40, Casablanca) e foi a grande homenageada este ano, em Cannes.


                                   


Luc Besson também dirigiu o filme francês “Nikita” (que depois virou série) também com o ator Jean Reno no elenco, e depois Besson ajudou no roteiro de “A assassina” (“Point of no return”), o remake americano com Bridget Fonda. Nikita é uma jovem viciada de uma gangue de delinquentes que, após matar um policial e ser presa, é recrutada para trabalhar para o serviço de inteligência do governo.



“A dama das Camélias”, de 1981 (do cineasta italiano Mauro Bolognini) conta a história real da bela cortesã (que inspirou o escritor Alexandre Dumas na famosa história clássica da literatura universal) e seu trágico fim, na França do século XIX.



Também da Gaumont, “Camille Claudel”, de 1988 (com Isabelle Adjani no papel principal e Gerard Depardieu como seu amante, o famoso escultor Auguste Rodin), ganhou nova roupagem, em 2013, agora com a também bela Juliette Binoche no papel da escultora francesa que terminou seus dias no anonimato, na biografia intitulada “Camille Claudel, 1915” (o ano em que a artista foi diagnosticada e internada como esquizofrênica).



Praticamente leiga em matéria de artes clássicas, eu até que conheço bastante sobre arte, mais uma vez graças ao cinema. Assim, o meu conhecimento do trabalho da talentosa escultora (muitos deles expostos no Museu D’Orsay, em Paris) me é altamente influenciado pelo cinema (a sétima arte não é só entretenimento, é pura cultura), e faz com que eu perceba a dor e o sofrimento nas obras da artista, principalmente quando foco o meu olhar sobre (e sob) a escultura intitulada “A idade madura” (L'Age Mûr, abaixo, no referido museu), que marca a tentativa de afastamento e futuro rompimento da artista com Rodin.


Como não dá para falar de todos os filmes distribuídos pela Gaumont, deixo a lembrança do polêmico “Jevous salue, Marie” (de Jean-Luc Godard), o clássico “E la nave va” (de Frederico Fellini) e o mágico e lúdico “Fanny e Alexander” (de Ingmar Bergman) que prometo um merecido texto, “a posteriori”, para cada um desses cineastas ímpares.

E termino este texto com outro cineasta apaixonado pela sua arte, o lúdico Walt Disney, que nunca deixou de sonhar com o cinema como parte da sua vida (e eu também).



Postado por *Rosemery Nunes ("Adorável anarquista")

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