Ninho vazio e divórcio na sétima arte





Dois corpos, aparentemente inertes, flutuando na água. Um casal. Um homem e uma mulher. A pergunta fatídica: estarão mortos??? Não. Ou melhor, fisicamente não. Mas, metaforicamente, parece que sim. E onde flutuam? Ironicamente, a cena se passa em pleno Mar Morto, numa região praticamente desértica , em Israel. Por isso flutuam tão facilmente (o excesso de sal torna a água muito densa não deixando que nada afunde).

A paisagem ao redor do Mar Morto é árida, praticamente sem vegetação, nada cresce ao redor (nem mesmo dentro) daquele imenso lago azul envolto numa orla repleta de sal (para nós, uma paisagem totalmente estranha, acostumados que estamos com os trópicos e sua vegetação abundante). 

Essa cena inusitada que acabo de descrever marca o início do filme “Ninho vazio” (“El Nido vacío”), do argentino Daniel Burman, e mostra os personagens principais, um casal cuja crise de meia-idade (e do próprio relacionamento) se aflora ainda mais com o “revoar” dos filhos (que vão viver suas próprias vidas longe da presença dos pais) – é a chamada síndrome do “ninho vazio”.


O diretor usa da linguagem do cinema para mostrar a reação individual de cada um dos personagens àquela nova realidade – filhos distantes... como fica a relação conjugal??? 
Ela, a mulher, reage euforicamente, como se a vida estivesse por um fio (não quer se sentir “morta”), não há tempo a perder, ela corre contra o tempo – quer voltar a estudar de onde parou, rever os amigos, se reinventar, e segue a vida, paralela ao seu parceiro, sem mais se “encontrarem”.
Ele, por sua vez, parece que quer, a todo custo, voltar no tempo (muito comum nos homens) e se perde em um turbilhão de emoções, reais e imaginárias – de novo o diretor inova, “usa e abusa” do desapego ao verossímil – o personagem ora está na sua poltrona de couro, e de repente já está num campo conversando com um amigo (provavelmente imaginário, porque os homens têm grande dificuldade em se abrir com os reais amigos), depois vai para a rua, depois “pula” para o desértico Mar Morto; o diretor vai jogando com imagens alucinatórias, em situações em que o personagem está (ou gostaria de estar?) vivenciando, numa clara alusão de que também “não quer estar morto”.
“Ninho vazio” é um filme singelo, sobre um casal em busca de dois inteiros e não de duas metades” (como insiste o diretor), com uma bela trilha sonora, músicas envolventes na bela voz de Jorge Drexler (cantor uruguaio que já ganhou o Oscar de melhor canção estrangeira, com a música “El otro lado del rio”, do filme do diretor brasileiro Walter Salles, “Diários de motocicleta” e já cantou no Brasil com Maria Rita, Arnaldo Antunes e Paulinho Moska). A bela música “Un instante antes de levantar vuelo” acompanha as agruras do casal na incursão pelo “ninho vazio”.



síndrome do ninho vazio é mais comum do que se imagina, pois a crescente autonomia dos filhos em geral assusta. Algumas pessoas adotam, ao longo dos anos, hábitos nocivos à relação conjugal, deixam de conversar abertamente sobre o que os preocupa, deixam de partilhar as suas frustrações e angústias, muitas vezes para se pouparem mutuamente. 

E muitos “jogam” toda a sua energia na educação dos filhos, enquanto outros se dedicam de corpo e alma à profissão. E em muitos destes casos, infelizmente, há “affairs” que vêm e vão… E, no meio dessa falta de conexão (que acaba muitas vezes em traições conjugais), vai-se (literalmente) “empurrando  com a barriga” a relação matrimonial. 
Mas o tempo não resolve sozinho tais dificuldades; ao contrário, traz à tona diferenças até então encobertas. Os casais que, em algum lugar no tempo, passaram a realizar percursos paralelos estarão, naturalmente, numa posição de maior vulnerabilidade, quando os filhos se vão.
É preciso encarar os fatos, e tentar encontrar um caminho em comum que se cruze; os estudiosos e psicólogos  insistem na necessidade de se revisar os antigos conceitos do matrimônio e as novas necessidades do casal no mundo contemporâneo (como liberdade de ir e vir, de ter amigos independentes e de não ter controle sobre o outro, respeitando a individualidade e a privacidade do outro). 

Do contrário o divórcio é o próximo passo mais natural, não adianta insistir se não há mais projetos a dois, se os caminhos correm paralelos e não mais se encontram. E então a angústia de ver os filhos saindo do ninho, observando o voo deles, pode muito bem ser compensada por novas paisagens, novos relacionamentos e novos desafios profissionais.

E o divórcio já faz parte do nosso dia a dia. Tanto que já existe até “festa de divórcio” (tudo começou lá fora, mas até no Brasil, essa “moda” já chegou) com direito a bolo dividido ao meio e docinhos “bem separados” como lembrancinha...


Mas talvez não precisemos exagerar com uma festa (como se comemoraria um aniversário ou um matrimônio), mas se o casamento não vai bem, não há razão para insistir só por conveniência e superficialidade (muitos mantêm, e outros até reatam, o casamento visivelmente falido) apenas por causa dos filhos, porque esses um dia se vão... melhor não adiar mais o sofrimento, melhor ser um(a) solteiro(a) feliz do que um(a) casado(a) em eterno martírio.
É certo que existe um tempo para “o luto” (mas que seja datado, óbvio), principalmente depois de um longo convívio (como foi o meu caso); mas também não precisa chegar ao outro extremo, regado de festas e badalações (pode ser mais comum nos breves relacionamentos, naqueles em que já visivelmente estavam fadados ao fracasso, mesmo antes da consumação).

Mas, de vez em quando, precisamos comemorar o enterro simbólico de um “ex” (eu mesma já fui convidada por amigas para ajudar a enterrar os seus “exs” e “tomamos todas” no tal pseudo velório), é uma maneira de ajudar “na travessia”.


E tem sido também relativamente comum o chamado chá de divórcio, uma santa ajuda dos amigos e familiares para se criar um ritual para dar apoio e consolar o atual divorciado e , de quebra, ajudar a montar a nova casa depois da separação. Para isso servem amigos e parentes.

E até musical sobre “divorce party” já foi montado na América, parodiando filmes como, por exemplo, “O casamento do meu melhor amigo”, com a velha conhecida “I say a little prayer”, de Burt Bacharach, e também melodias famosas como  “Respect”, um dos grandes sucessos de Aretha Franklin, e outras igualmente conhecidas e famosas. 




Finalmente, para descontrair diante destes árduos temas e para provar que os filhos nada têm a ver com a relação desgastada do casal, assista abaixo algumas razões que podem levar uma relação a acabar em divórcio (uahuahuah).

Postado por *Rosemery Nunes ("Adorável anarquista")

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