Clichês do cinema americano




O cinematógrafo foi inventado na França, pelos irmãos Lumière, na virada do século XIX/XX, e constitui o marco inicial da história do cinema. E assim nascia o que não era ainda considerado uma arte genuína, mas o “rebento” logo migrou para os EUA (a Europa encontrava-se destruída pelas duas grandes guerras) e lá “viveu a infância e a adolescência” (era a época dos musicais melosos de Hollywood).

E já “adulto”, o cinema partiu, inicialmente “a passeio”, de volta para a sua terra natal, o continente europeu, e virou “cult” com a revolução estética da  “nouvelle vague” de Truffaut e Godard e o cinema instigante do sueco Bergman, nos anos 50/60, fazendo jus ao título de “a sétima arte” (termo criado pelo crítico de cinema italiano Riccioto Canudo, no início do século XX, no “Manifesto das Sete Artes”), se disseminando então pelos cinco continentes.

Mas foi na América que o cinema proliferou, e adquiriu “os vícios e maneirismos” americanos. E assim, por mais que a gigantesca produção estadunidense gere filmes esplêndidos, também produz muitos filmes medianos (para não dizer medíocres), sendo alguns “puro trash”, os chamados filmes comerciais (ou também conhecidos como “enlatados”), e para produzi-los em larga escala, criaram-se “regrinhas”, verdadeiros chamarizes (ou não) de bilheteria – são os eternos e famosos clichês do cinema americano.

Muitos dos clichês chegam a ser hilários de tão óbvios, batidos e previsíveis. Já perceberam o que acontece quando o mocinho finalmente vence o bandido? Ele (o mocinho), muitas vezes, deixa atrás de si um rastro de destruição, fogo e explosões, e sai andando lentamente (câmera sempre em “slow motion”) e jamais (jamais mesmo) “nosso herói” olha para trás, aconteça o que acontecer.


Não perceberam isso? Pois Andy Samberg fez “história” com esse clichê – o ator e comediante, do programa humorístico americano “Saturday Night Live” (SNL), em 2009, ao participar da entrega dos prêmios do “MTV movie awards” (o canal homenageia os melhores filmes, atores e produtores do ano, votados pelo público através do site oficial da emissora) apresentou a hilária música “Cool guys don’t look at explosions”, ironizando o famoso clichê (junto com Will Ferrell “fantasiado” de Neil Diamond e também o produtor de cinema J.J. Abrams, um dos produtores da série “Lost”).




O lugar comum. Chavões. Os clichês tanto podem botar abaixo uma grande história, como podem fazer um livro sério virar uma verdadeira piada na telona e transformar uma interessante história em pura decepção. Existem situações que beiram o ridículo de tão batidas, num evidente flagrante de total falta de criatividade, comprometendo muitas vezes o contexto geral do filme. 

Outros destes clichês famosos: já notaram que, com toda a tecnologia avançada dos americanos, os carros de lá sempre cismam em não funcionar nas horas mais críticas e angustiantes dos filmes de suspense e de terror? Já repararam que, em uma perseguição de carros, sempre tem uma feira para o carro passar por cima, com legumes voando para todo lado?  

Coincidentemente, sempre que se liga a TV, o noticiário está exatamente na hora da notícia que mais interessa para a história. Já os elevadores sempre estão no andar certo, menos quando o herói está sendo perseguido. E as armas de fogo? As balas são inesgotáveis e se por acaso o herói fica sem munição, joga a arma fora e pronto, ele tem sempre dezenas de armas extras (a comédia Hot shotsno Brasil, Top Gang uma sátira ao filme Top Gun, debocha desses famosos clichês em suas cenas).

 

Já perceberam que a língua oficial de qualquer civilização alienígena é sempre o inglês? E que, em toda catástrofe ou invasão extraterrestre, Nova York é sempre o alvo principal da tragédia? E não se sabe o porquê, mas todos os animais possuem alguma espécie de sexto sentido, percebem o perigo, mesmo que improvável, e de algum jeito, avisam o seu dono. 

Casas mal-assombradas nunca estão trancadas, e a porta sempre se fecha sozinha, atrás do curioso que acabou de transpassá-la. E quando alguém decide dançar na rua, qualquer um que passe ao lado sempre conhece todos os passos da dança (o filme 500 dias of Summer brinca com este famoso clichê, com direito a passarinho azul” e tudo).



Presidente americano (texano) imbecil? Jamais. Nunca veremos um Bush retratado no “cinema clichê”. Um presidente americano é sempre um super-herói e imortal, pronto para defender seus cidadãos com a força dos próprios punhos, se assim for necessário. 

Cenários apocalípticos (no filme “2012”, nem o nosso Cristo Redentor escapou da destruição em massa) em que o herói sempre escapa, e sempre por um triz, de ser engolido ou soterrado (aliás, James Bond, o agente 007, é hors-concours” nessa arte). E claro, não pode faltar a bandeirinha americana, sempre tremulando em algum canto do cenário. E por aí vai... clichês e mais clichês. 

Mas os clichês podem ser muito divertidos quando, de forma proposital, são usados sarcasticamente em filmes de humor. O programa humorístico SNL é especializado em satirizar acontecimentos históricos, artistas, políticos e todas as formas de artes em geral, aí incluindo, claro, também o cinema, como por exemplo, a paródia que mistura o Terminator com a história de Cristo.



Até os cartazes dos filmes são um eterno “lugar-comum” – nos filmes de comédias românticas vemos os casais de costas um para o outro, sempre sorrindo, com “aquele olhar 43” (em “Uma linda mulher”, “Como perder um homem em 10 dias”, “O amor custa caro”).

O ator comediante Will Ferrell, antiga cria do SNL, sempre é visto em seus filmes parodiando os eternos clichês do cinema americano, chamando a atenção para eles e, em geral, ridicularizando-os. Na comédia Os outros caras (“The other guys”), o diretor brinca com esse clichê e cria um cartaz animado, satirizando a clássica apresentação do policial “fodão”, com Will Ferrell e Mark Walhlberg num divertido cartaz promocional do filme.


Também o ator Leslie Nielsen (morto em 2010) nos divertia com os seus clichês escandalosamente explícitos. No filme “Apertem o cinto, o piloto sumiu” (Airplane!), o ator faz uma divertida paródia de um batido clichê que aparece sempre em situações de pânico, quando alguém perde o controle e surta, e tem que ser contido por outro personagem. E em Todo mundo em pânico (Scary Movie) ele é um presidente pateta (aí sim, retrata-se um Bush da vida real).



Da próxima vez que for assistir a um desses filmes tipicamente comerciais, “enlatados bem ao estilo blockbuster”, lembre-se dos clichês – procurar por eles (a lista é enorme, citei só alguns) já virou mania entre fissurados em cinema, e realmente é uma diversão à parte, principalmente quando usados propositadamente e sarcasticamente. Divirta-se. É um verdadeiro “onde está Wally?” cinematográfico (ou, em inglês, “Where’s Waldo?”).





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