"A hora do recreio" na sétima arte e na vida real




Acabo de dar adeus (na verdade, literalmente foi “um basta”) a um dos meus trabalhos (sou médica, mas “Hollywood me aguarda”, rsrsrs, explico melhor adiante), e a convivência por muito tempo com os meus queridos residentes (um tipo de pós-graduação na área médica) é, com certeza, a única “sensação de perda” que me acometeu com esta minha recente despedida.

Conviver tanto tempo com jovens estudantes é sempre prazeroso, me faz sentir-me sempre eternamente jovem, porque me remete à lembrança dos bons tempos de “recreio”, quando a vida era mais leve e o mundo parecia um parque de diversões. 

Sou uma espécie de mestra para eles, em todos os sentidos da palavra, tanto na vida profissional (ensino um método diagnóstico cardiovascular) como na vida pessoal (não é incomum que me peçam desde conselhos de relacionamentos e de autoestima até dicas de moda  não é a toa um dos meus apelidos, fashion”, que ganhei por conta do meu estilo).

E, em comparação com o outro setor (no mesmo local) que eu trabalhava (a verdadeira razão para a minha derradeira saída), o contraste se fazia porque lá não podia haver “recreio”, sempre rolava um clima pesado (absurdamente agravado nos últimos tempos), a tal ponto que a minha sensação (no tal setor “macabro”) era sempre de “nuvens densamente carregadas”...

Sabe aquela cena clássica de quadrinhos em que uma nuvem negra está sempre pairando sobre a cabeça de um pobre coitado, perseguindo-o o tempo todo? Pois é assim que eu me sentia quando adentrava o tal lugar nos últimos tempos, com direito a raios e trovões no melhor (pior) estilo da animação “Família Adams” (lembram? o carro da tal família macabra estava sempre sendo seguido por uma nuvenzinha negra,  trovejando e relampejando onde quer que eles fossem)... cinéfilo é assim, imediatamente uma cena de cinema logo vem povoar nossa mente... 



Em contrapartida, o que mais me agrada nessa despedida (além de me livrar da “nuvem negra” daquele ambiente hostil) é não ter nunca mais que acordar cedo (maldito celular/despertador em dia de plantão diurno!!!) porque só lá é que eu tinha esse compromisso; em todos os demais lugares onde trabalho eu posso determinar a hora que eu vou trabalhar (“no more stress”, “no more a future heart attack” ); ainda mais eu, uma pisciana “adorável anarquista”  totalmente avessa a regras e horários... e cinéfila, novamente esses árduos horários sempre me fazem lembrar o curta de animação “Alarm” (sou exatamente assim, kkkkkk).



Em compensação lidar com jovens residentes me remete aos meus tempos de estudante... e de novo o cinema...me fazendo lembrar do ótimo seriado “Scrubs” (as primeiras temporadas são as melhores) – a série americana mostra os bastidores do dia a dia dos residentes de um hospital, com os seus dramas (e alegrias compensatórias) que sempre rolam na rotina diária de um “sofredor” da medicina, intercalando cenas  engraçadas (porque ninguém é de ferro) com cenas emotivas (de tristeza e de impotência diante da morte  e a trágica cena abaixo, do seriado Scrubs”, sempre foi o meu dia a dia), fazendo jus ao dito popular “de médico e louco...” (e, com muita honra, eu tenho um pouco dos dois).



Mas o seriado mostra também que podemos relaxar e divagar durante o nosso cotidiano! Quem é que nunca quis um dia se livrar daquele professor pentelho ou de um colega de trabalho, típico motherfucker”, que azucrina e atazana o nosso santo dia? E para J.D. (personagem de Zach Braff em “Scrubs”) há sempre um jeito de fazer isso, nem que seja só na imaginação fértil dele (e eu já fiz “estragos” me livrando de muitos na minha imaginação, rsrsrs).



E em Scrubs” (como no meu dia a dia), vamos encontrar todos eles, os professores chatos (mas também aqueles eternos que nos marcam para sempre), tem aquele cirurgião que se acha “o fodão”, tem os encontros nos bares para combater o estresse da semana, tem as festas de confraternização de fim de ano e nos congressos, tem os conselhos sentimentais, e por aí vai...

E, como na sétima arte, muitos dos meus queridos residentes vão deixar saudades... têm os que já terminaram a residência, mas continuam fazendo parte da minha vida, mesmo à distância, como é o caso da doce Mel (Mellanie) que me confessou ter mudado sua vida pessoal após começar a ler os conselhos contidos nos meus textos.

Por conta dos meus conselhos de vida (em relação a autoestima, amor próprio e autovalorização como mulher, e como ser humano principalmente, nos relacionamentos com o sexo oposto) a Mel agora, radiante, está a espera do seu primeiro herdeiro, após finalmente encontrar um parceiro a sua altura em matéria de respeito mútuo (e fico feliz que meus textos tenham contribuído para isso).  E sempre me lembro do meu querido residente Gilberto quando uso o meu anel de pedras que o mesmo me presenteou quando terminou o seu período no meu setor.

Dos atuais, a minha querida Manu (Emanuella) é a intelectual do grupo, de óculos é a “mandona” (e quando se junta comigo, somos imbatíveis nesse quesito, rsrsrsr), é a “professoral” do grupo (sem óculos é uma sensual e graciosa garota), e como uma perfeita e poderosa rainha põe (e impõe) toda a “tchurma” de residentes aos seus pés.

Agora vamos ao meu querido “monstrinho” Daniel, vulgo Magalha... sabe aquela criatura que suplanta a genialidade do mestre? (tanto eu como o meu monstrinho não somos nada modestos, rsrsrsr)... pois é este o meu monstrinho...eu, há muito, já vinha percebendo o quanto o mesmo vinha me superando...

Mas o apelido (“monstrinho”) pegou mesmo, num belo dia, durante a conclusão de um exame (que eu e a Manu começamos e o meu amado residente finalizou), pois na hora do laudo ele titubeou em fechar o meu diagnóstico (a parte inicial feita com a Manu), alegando que ele “não tinha presenciado e documentado o início do mesmo” – ou seja, “a criatura estava a questionar o criador”(kkkkk) – e eu tive certeza, dali em diante, que eu tinha criado um “Jovem Frankestein” (olha o cinema aí de novo), mas a poderosa Manu resolveu “o impasse” com toda a autoridade que lhe é natural: “escreve aí,  Magalha, e fecha o bico” (Uahuahuah.  Amo esses dois de paixão).



Tem a espevitada Bruninha que sempre me chama para correr na praia, mas eu vivo “correndo” desse esporte, porque prefiro gastar calorias e melhorar a performance física nas aulas de dança (jazz e tango, por exemplo).

Tem o Washington que é o “meu carma, minha cruz” (“just kidding”, óbvio) que vive “me perseguindo”, sobrecarregando minha agenda com exames extras (sem marcação prévia), para se livrar do “carão” dos seus superiores que não lhe dão trégua (“taca fogo” neles, Washington, rsrsrs, nem que seja só na imaginação, como em “Scrubs”).

E ainda tem uma galera... tem o Neves (xará do Magalha), a Nanda (Fernanda), a Patty (Patrícia), a Aryane, a Renata, o João, o Renan. o Emerson, e por aí vai... cada qual com seu jeitinho e sua peculiaridade que fazem com que fiquem marcados para sempre nas nossas mentes e nos nossos corações...

Eles passaram a fazer parte do meu cotidiano e vice versa, eu frequentava o “cafofo” deles (quarto dos residentes) com café exclusivo (meu único vício), encontro nos bares para um bate-papo regado a cerveja e quitutes, e por aí vai... 

E a Manu, sob o pretexto de me entregar o convite do seu casamento (estaremos todos lá, sem falta, em novembro), junto com os demais me prestigiaram com uma festa surpresa de despedida no cafofo deles, com direito a cartazes de felicitações por conta da minha futura empreitada (fazer cinema com o objetivo de me tornar uma roteirista da sétima arte, daí o cartaz feito por eles, “Hollywood te espera”, que eu brinquei no início do texto).

E como tudo me leva ao mundo do cinema, a festa surpresa me fez lembrar do ator Sidney Poitier em To Sir, with love (Ao mestre, com carinho), filme dos anos 60 em que o protagonista, um carismático professor negro, dá lições de vida numa comunidade pobre londrina, indo muito além do cotidiano acadêmico de uma escola para alunos britânicos carentes. Assim como o professor do tal filme, eu também me entristeço ao saber que vou me afastar dos meus querido alunos, mas infelizmente o outro setor não me deixou escolha, era tudo ou nada...



Em tempo: a alternância entre responsabilidade e “hora do recreio” (como é o meu cotidiano com os meus residentes, que bem sabemos como dosar entre um e outro extremo) é que tornam um ambiente saudável e suportável (ainda mais num ambiente estressante que é o hospitalar, onde a vida muitas vezes está por um fio).

Ao conhecermos as pessoas e seus problemas e dificuldades (o que não acontecia no meu outro setor, lotado de indivíduos amargos, egoístas, individualistas e alheios uns aos outros que, ao que parece, não tiveram infância) aprendemos a ser mais tolerantes e mais amáveis e brincantes uns com os outros (as divertidas cenas dançantes do seriado Scrubs”  e dançar é comigo mesmo  reproduzem também o meu dia a dia, com os meus residentes, dentro e fora do ambiente hospitalar). 



E ficamos de marcar um karaokê para uma cantoria em duplas (vamos treinar como combinamos, hem, Renan?)... e aproveito o cinema como exemplos para os ensaios... vai aqui exemplos famosos de atores dando uma de cantores, com coreografia e tudo... John Travolta e Olivia Newton John em “Grease, nos tempos da brilhantina”... ou então os diversos karaokês do filme “Duets”... ou quem sabe ensaiamos a performance dos atores do filme “500 dias com ela”?... ou que tal o do “Casamento do meu melhor amigo”?... Escolham e comecem a soltar a voz!!!



E a dupla Olívia/Travolta repetiram a dose vinte anos depois, num programa americano e voltaram a fazer o mesmo sucesso na eterna performance adolescente do filme (nada como ser brincante pela vida afora, não importando quanto tempo passe).



O filme “Duets” (do ano 2000) acontece exclusivamente num concurso de karaokê e uma das músicas da trilha sonora é “Cruisin”, com a atriz Gwynet Paltrow e o cantor/ator Huey Lewis cantando e arrasando no palco – eu e um amigo já “pagamos esse micaço” ao vivo e a cores, num bar de karaokê, sem nenhum ensaio prévio, mas até que a plateia curtiu e cantou junto (parece que quanto pior se canta nesses bares, mais aplausos se ganha, rsrsrs), foi muito divertido.




“Duets” é praticamente uma “sessão da tarde” sem grandes pretensões, mas irresistível por conta de algumas dessas performances musicais. Além de “Cruisin”, no  mesmo filme, os atores Paul Giamatti (de “Sideways”) e Andre Braugher cantam o clássico “Try a little tenderness”, dos anos 60, do famoso cantor americano de soul Otis Redding.



E essa mesma famosa música (“Try a little tenderness”) pode ser ouvida também em “A garota de rosa shocking” (“Pretty in pink”, dos anos 80), na ótima e hilária performance do ator Jon Cryer (hoje bastante conhecido como Allan, o “irmão” do agora falecido personagem de Charlie Sheen, na série americana “Two and half men”).



Em geral são filmes “médios” em termos de conteúdo, como algumas comédias, dessas estilo “rasgadas”, mas vez ou outra uma cena com determinada música combina tanto, que faz parte de toda a graça do filme, como a hilária cena do ator Terry Crews em “As branquelas” (“White Chicks”), cujo personagem “prá lá” de másculo adora a música (bem ao estilo patricinha) “A thousand milles”.



Já no filme “500 days of Summer” (no Brasil, “500 dias com ela”) o protagonista, um romântico incorrigível, o ator Joseph Gordon-Levitt (ele era o jovem alienígena da extinta série americana “3rd rock from the sun” com o veterano John Gleese), improvisa no karaokê cantando “Here comes your man” do grupo Pixies. 



Enquanto no mesmo filme, ainda na sequência do karaokê (onde um grupo de colegas de trabalho encontram-se para a sagrada hora do recreio) a atriz Zooey Deschanel aparece cantando “Sugar town” (música dos anos 60 cantada na época pela filha de Sinatra, a cantora Nancy Sinatra).



E a famosa música “I Say a little prayer for you”, de Burt Bacharat, vira “declaração de amor” do amigo gay (o ator gay Rupert Everett) de Julia Roberts, sob o olhar desolado de sua verdadeira paixão, papel do ator Dermot Mulroney, em “O casamento do meu melhor amigo”.



Esse texto foi escrito em homenagem aos meus queridos residentes, inclusive os não citados, porque, infelizmente, não dá para falar de todos (e aí, gostaram das dicas? mais alguma outra sugestão?), mas a dica é extensiva para todos os que, assim como eu, adoram uma “hora do recreio”, e nada melhor que a sétima arte para “desestressar” da labuta diária, afinal “cinema é ainda a maior e mais democrática diversão do planeta”.

Postado por *Rosemery Nunes ("Adorável anarquista")


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