Pai (herói): sensibilidade em primeiro lugar





O texto de hoje é dedicado ao “Dia dos pais”. Mas a minha homenagem volta-se, na verdade, para os novos pais, esses pais que, com muito custo, estão aprendendo a chorar com seus filhos, a dar o ombro amigo e a não ter vergonha de se mostrar frágil e emotivo. A saber, para aqueles pais que, antes de se tornarem homens, aprenderam a ser “humanos, demasiadamente humanos” (parafraseando Friedrich Nietzsche).

Dedico esse texto para os homens que, orgulhosamente, estão aprendendo a ser verdadeiros pais. Porque nós, mulheres, sempre participamos ativamente da vida dos nossos filhos. Já “nascemos mães” (claro que isso é cultural, nem todas nós temos o dom da maternidade, mas nos colocam desde cedo uma boneca nos braços, antevendo o que nos espera a vida), já os homens...

Tristes e pobres coitados dos homens!!! Mal acabam de nascer, já são exigidos e desafiados a não terem medo, a não fraquejarem, a “empunharem armas” contra emoções e sentimentos, desde muito cedo, ainda na tenra idade. “Homem não chora”, quantas vezes já não ouvimos isso??!!... Os homens não nascem pais, eles se tornam pais (alguns, infelizmente, nunca saberão o que é isso, pois são meros reprodutores).

E, voltando a Nietzsche, o filósofo alemão, ainda no século XIX, revira o velho e arcaico conceito das “realidades eternas e das verdades absolutas”, sugerindo a criação do que ele chamou de “espírito livre”, ou seja, “o indivíduo que pensa (e age) de forma diferente do que se espera dele”, insistindo que “o homem precisa descobrir-se como humano”. Apenas “humano, demasiadamente humano”.

E sensibilidade é a sutil diferença entre ser homem e ser macho. O belo comercial da Sprite (ao som de “To love somebody”, do Bee Gees) é o melhor exemplo disso, com a bela imagem do pai da menina, pouco se importando com o que os outros (machos) vão pensar dele. 



Aí, em pleno século XX, entra em cena o “filósofo” popular Raul Seixas “prefiro ser essa metamorfose ambulante do que ter aquela velha opinião formada sobre tudo” e, ainda assim, muitos homens continuam a se portar de acordo com os velhos preceitos dos chamados “livros sagrados”, que pregam uma sociedade patriarcal arcaica, em que “macho não chora” e a mulher “fruto de sua costela” deve manter-se submissa a seus desejos e caprichos.



E, ao invés de uma convivência justa e humana, estamos eternamente subjugados a uma sociedade perversa (tanto para o homem como para a mulher) que ridiculariza o homem sensível (“só pode ser gay”, como diria o francês Olivier Teboul, que citei no texto anterior) e condena a mulher que faz escolhas profissionais ao invés de familiares.

E o espírito livre que tanto pregou Nietzsche? Liberdade é poder escolher ser dona de casa por opção, e não por obrigação (e não ser perseguida por feministas, ao se fazer essa opção, desde que seja de fato uma opção, óbvio), ou escolher ser profissional liberal e poder optar também por não querer ser mãe (sem ser rotulada pelos machistas, pela então escolha, como “mal amada, insensível e frígida”).

Minha homenagem ao pai que participa e comemora a vitória do filho no esporte da escola (mas que também, sem cobrança, o consola quando a medalha de ouro vai para o amiguinho e não para o filho querido).

A minha singela homenagem ao pai que não esquece seu papel de pai amigo e confidente (e não de “coleguinha” permissivo e servil ao filho prepotente). Ao pai que comparece ao “conselho de classes” da escola do filho, e que sofre junto (encarando seriamente, sem deboche) os "pequenos grandes" dramas da juventude/adolescência do filho.

E o cinema, como sempre, não podia deixar de dar o melhor exemplo: o divertido e, ao mesmo tempo, emotivo filme "Actually love" ("Simplesmente amor") mostra divinamente essa cumplicidade, no caso, a crescente e bela relação entre um padrasto (Liam Neeson) e um menino (Thomas Sangster) que acaba de perder sua mãe.





E nos incutiram a ideia de que o homem (ainda do "tempo das cavernas") foi "feito para caçar"(proventos para a família,e, de quebra, os famosos "pulos de cerca") e a mulher seria a eterna "dona da cozinha"(submissa só entenderia de "esquentar a barriga no fogão e esfriar no tanque").
O filme ficcional "Mulheres perfeitas"("Stepford wives") com Matthew Broderick e Nicole Kidman (não é nenhum filmaço, mas é "assistível" e relevante em relação ao tema) mostra que, em geral, são os homens que querem as tais "mulheres perfeitas" (??) de outrora; mas nós mulheres (que deveríamos ser as principais interessadas) não estamos nem um pouco animadas com esse retorno do passado, pois as tais só convêm aos homens (trogloditas, diga-se de passagem).


Pois, para nós, como o filme retrata, ela é a imagem perfeita da mulher robótica, que não tem sentimentos, não ri, é apenas servil como qualquer estrutura cibernética. Queremos ser tratadas como seres humanos, nem melhor nem pior que os homens, com erros e acertos, raiva, alegria, solidão, tristeza, amor, compaixão e sedução.

Por exemplo, ao invés de nos oferecerem para abrir a porta do carro, nos ofereçam “a porta do coração”, não mais nos traindo, como as “mulheres perfeitas” aprenderam a aceitar (mas não a deixar de sofrer). Pois a dor da traição dói em nós do mesmo jeito que dói em vocês, nos fere a alma e o orgulho, nos baixa a autoestima, assim como acontece com vocês quando traídos.

Mas, para esses homens traidores, as mulheres perfeitas do passado “não sofriam”, pois “a traição fazia parte do gene do macho”, “estava no sangue”, “é testosterona na veia”. Mas, na verdade, nossas mães e avós choravam escondidas as traições de seus homens, e nós (filhas e netas) assistimos a isso, e definitivamente não aprovamos, e não queremos mais passar por isso, nem nós nem as nossas futuras gerações de mulheres (e, por que não dizer, de homens).

Mas se tudo é "hormonal", se o homem, por exemplo, não nasce com o "dom da culinária", por exemplo, então como fazem os grandes "maîtres" que sempre são homens (e, em geral, não gays)? Ou seja, quando convém (leia-se, quando "o dim dim fala mais alto") o homem se vira e rapidamente aprende a arte de servir a mesa (óbvio que nem sempre é assim, vide o Paulo Thiefenthaler em "Larica Total", uahuahuah).





E as mulheres, que eram consideradas “obtusas” na direção ao volante, nas empresas, nas máquinas, por que cada vez mais se sobressaem nessas áreas? A explicação é simples: não tem mágica (que “hormonal”, que nada!!!), é só uma questão cultural e de oportunidades (que, no passado, não nos era dada - mulher dirigir??!!). A verdade é que a única diferença entre os sexos é a força física (a musculatura esquelética do homem é mais forte que a das mulheres por conta da famigerada testosterona). E só.


Sou contra machismo e contra essa sociedade patriarcal que rotula papéis demarcados na sociedade para homens e mulheres, mas a questão 
também não passa pelo feminismo, e muito menos eu ousaria reivindicar uma nova (?) sociedade matriarcal (é bem verdade que existem, na atualidade, culturas em regiões da China e da Indonésia em que as propriedades e os nomes das mulheres é que são passadas para os filhos, os homens fazem os serviços domésticos e são dominados pelas mulheres).

Há relatos da Antiguidade que, antes de Eva, Adão tinha outra mulher – há referências nos livros sagrados dos judeus, o Talmude, sobre “Lilith, a mulher de Adão antes de Eva” – que reivindicava direitos iguais, e por isso foi literalmente “abduzida” da Bíblia Cristã e demais livros sagrados.  Na literatura (não religiosa) vemos referências frequentes a isso, como em “Fausto”, de Goethe, em que Mefisto apresenta "Lilith, a bela" como a esposa "número um" de Adão".


A figura de Lilith tem sido omitida nos livros sagrados, mas a tradição judaica, suméria e outras, ainda preservam sua história. Mesmo que omitida, parece que existem vestígios que comprovam sua presença no texto de Isaías, no Antigo Testamento, mesmo com nomes diferentes nas diversas traduções da Bíblia.


Seguindo a velha tradição, pode-se dizer que o feminino sempre foi visto como ameaçador, foi desvalorizado e demonizado. Já a literatura interessa-se sobretudo por “Lilith, a bela revoltada” que, na afirmação de seus direitos à liberdade e ao prazer, à igualdade em relação ao homem, “perde a si própria, assim como perde aqueles que a encontram” (“Fausto”, de Goethe).


O livro “Código da Vinci” (o filme deixa muito a desejar, pois parece confuso para quem não leu o livro, e perde muito do suspense da leitura) é instigante e intrigante na reconstituição histórica em meio a ficção e, no final do livro, o grande questionamento sobre a origem matriarcal da humanidade que, dizem, foi usurpada pelos homens, e que, a partir dos textos “sagrados” da Bíblia, sacramentou-se a sociedade patriarcal e a onipotência do homem sobre a mulher (e, até hoje, nós mulheres temos que nos contentar em sermos apenas “uma costela do homem”.


O livro tem uma leitura dinâmica, rápida e envolvente, realmente fácil de agradar a qualquer leitor, tal o suspense que há por trás da história da igreja católica ortodoxa e dos segredos que poderia mudar toda a história da Humanidade, segundo o livro. Assim como aconteceu com “Cem anos de solidão”, de Gabriel Garcia Marques, o livro “Código da Vinci” foi muito criticado na época do lançamento, por conta do “sucesso e da tiragem popular” (e, óbvio, pela polêmica religiosa). Mas, quem quiser se aventurar pelo cinema e preferir assistir ao filme (com Tom Hanks, Audrey Tautou e Jean Reno)...


“Nem patriarcal nem matriarcal”, a sociedade deveria buscar seu rumo numa nova sociedade onde todo ser humano (independente do gênero) deixasse aflorar o seu lado feminino e masculino ao mesmo tempo, toda a natureza humana em sua totalidade, com certeza geraria ganhos infinitos para a humanidade.

“Há mais mistérios entre o céu e a terra do que pode imaginar nossa vã filosofia”, portanto não me venham com teorias aparentemente confirmadas “hormonal e geneticamente” sobre a diferença entre homens e mulheres. 

No passado, a “verdade” dos grandes filósofos da Antiguidade girava em torno do geocentrismo, do criacionismo e do determinismo divino para, séculos depois, na visão da ciência moderna, Copérnico, Galileu e Newton jogarem por terra esses arcaicos conceitos, passando o “rei sol” a ser o verdadeiro centro do Universo, e vieram as leis da gravidade e a teoria de Darwin com sua evolução por seleção natural das espécies e o determinismo genético.

E, já na virada do século XX (que agora também já ficou para trás, quem sabe o que mais vem por aí...), surge a nova visão da ciência contemporânea, do universo quântico de Einstein “explodindo” a visão heliocêntrica Newtoniana, e o questionamento do próprio determinismo genético de Darwin (que acabou por inspirar e validar inclusive o próprio Holocausto) fez surgir o determinismo estrutural, sugerindo que “não há planos, mapas ou instruções pré-formadas”, e o processo evolutivo é então determinado de momento a momento no curso da História, “não existindo portanto determinismos a priori, nem muito menos seleção dos mais aptos”.

Assim, se “não existe uma realidade eterna nem uma verdade absoluta” nem entre os grandes estudiosos (ainda bem, porque senão o que seria da ciência e da evolução, nada pior do que "ter sempre certeza de tudo", como dizia Raulzito), por que então não questionarmos os estudos sobre diferenças entre o sexo masculino e o feminino, e aceitarmos como diferenças culturais e nada mais? (se for a velha e eterna brincadeira da divertida e pseudo "guerra dos sexos", como no vídeo abaixo, vá lá, aí tudo bem...).

E deixo a lembrança do belo filme "Yentl" em que a protagonista judia (a atriz/cantora Barbra Streisand), na Polônia do início do século XX, se vê proibida de ler os livros sagrados (destinados só aos homens) após a morte do seu pai, o que a faz indignar-se (se travestindo de homem para poder estudar) e a questionar as limitações impostas ao seu sexo, já que em casa foi o próprio pai quem a iniciou nos tais estudos (proibidos)  o que nos leva a pensar no papel fundamental de um mediador (e nada melhor que os pais atuando como tal) na formação da nossa juventude, na mudança de visão desses nossos novos jovens.


Somos todos filhos da História (culturalmente falando) e não de genes pré herdados e hormônios documentados. Viva a liberdade quântica e evolutiva do pensamento contemporâneo!!!

Num mundo violento como o nosso em que a arma de fogo substituiu a força física, cabe a nós mulheres ensinarmos a essa novíssima geração que aí desponta (nossos filhos, netos e bisnetos) a desenvolver o lado "maternal e fraternal" nos homens, pois só a sensibilidade será o grande diferencial para construir homens no lugar de máquinas  o cérebro e o coração são regidos pelos mesmos processos, tanto nos homens como nas mulheres, e os que perceberem isso sairão ganhando, com certeza.

Num mundo de armas e bombas nucleares, a diferença estará exatamente em explorar, nas novas gerações, os sentimentos, a solidariedade, a hombridade, a fraternidade, e não mais dividir o mundo em machos e fêmeas, “os que defendem” (os machos) e os que “são protegidos” (as fêmeas) – o grande diferencial para a paz num mundo globalizado (e hiper conectado) é ensinar a se sensibilizar.

Porque, cada vez mais, nossos filhos precisam de “pães”, ou seja, precisam de ambos os genitores nos papéis de pai e mãe, numa verdadeira simbiose que só tem a enriquecer a vida dos nossos pimpolhos.

E, ao som da bela e eterna música “Pai”, deixo meu conselho final, para esse “Dia dos Pais”: usem o coração, e não a “ciência”, para educar seus filhos (principalmente nossos filhos homens). O futuro das próximas gerações (tanto de mulheres como homens) agradecerá.

Postado por *Rosemery Nunes ("Adorável anarquista")

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