Curta um curta (e outras artes afins)



Eu, literalmente, fico sem assunto, praticamente muda (e quem me conhece, há de achar estranho, pois costumo ser muito, mas muito, tagarela entre amigos), se estou numa roda de bate-papo, num “happy hour” por exemplo, no qual só se fala de futebol (no caso dos homens) e novelas (no caso das mulheres). 

E mais chato ainda quando os mesmos resolvem inverter esses (chatos, mas tradicionais) papéis, ou seja, mulheres que parecem adorar discutir futebol (tenho minhas dúvidas se gostam mesmo, ou se é “só teatro”, para serem “admiradas” pelos machos) e... pasmem, tenho amigos (não gays, o que é pior) que adoram comentar o último “barraco” que rolou na “novela das oito” (ou então na casa do “Big Brother Brasil”, vulgo “BBB”, outra chatice homérica). 


E eu acabo me recolhendo à minha (saudável) ignorância nesses assuntos “prá lá” de chatos e batidos, pois é sempre a mesma ladainha – foi pênalti ou não ? era impedimento ou não? (no caso do futebol) ou então, a(o) fulana(o) traiu ou não? é “piriguete” ou não? (no caso das novelas e do BBB) – haja cultura inútil e papo simplesmente jogado fora, na minha visão de cinéfila e apreciadora de artes e afins (assistir futebol, vá lá, mas ficar horas discutindo o quê ???), não dá para entender o porquê de tanta falação, pois para mim não tem nada para discutir (no máximo, comemorar ou lamentar o jogo, e só); quanto a novelas e BBB... sem comentários. 


Dizem que o futebol é “a preferência nacional”; eu acho que é falta de conhecimentos das coisas boas da vida, de coisas realmente relevantes que provoquem reflexões profundas, e que podem mudar inclusive a visão do mundo,  “por dentro e por fora” da gente. Jogar uma “pelada” entre amigos, vá lá, esporte sempre é saudável,...mas discutir por horas a fio o famigerado jogo do time e ainda “saírem no tapa” como já presenciei aos montes, entre torcedores (rivais ou não) e até entre locutores e comentaristas???!!! Aff...



E aí quando eu pergunto, no tal círculo de amigos, o que acharam “do curta que ganhou o Oscar”, parece que eu sou uma “ET”, pois mal sabem do que se trata, quanto mais emitir qualquer opinião sobre o assunto. E olha que eu cito o popularíssimo “Oscar”, imagina se eu me metesse a perguntar sobre o Sundance Festival (em Park City, Utah/US), o “Tribeca” (de Nova York), o Festival de Cannes (na Côte D'Azur francesa), o “Comic Con”, e por aí vai... 

O “Comic Con”, por exemplo, é um evento que acontece anualmente em várias partes do mundo – o mega evento sempre rola no verão de San Diego, na Califórnia (onde começou timidamente na década de 70, mas já se estendeu também para Nova York, Las Vegas, Sidney na Austrália, Toronto no Canadá, e agora também em São Paulo), com o objetivo de promover os lançamentos e novidades do mercado dos quadrinhos, games, brinquedos (colecionáveis em sua maioria), filmes (longas e curta-metragens) e séries televisivas.

E muitos dos aficionados em manifestações artísticas da 7ª à 11ª arte (que inclui cinema, histórias em quadrinhos ou banda desenhada ou simplesmente BD, jogos eletrônicos e artes digitais em geral) se vestem “a rigor”, fantasiados no melhor estilo de seus heróis prediletos, e estes fanzocas reproduzem inclusive “a performance e os malabarismos” característicos dos seus ídolos – são os chamados “cosplayers” (“cosplay” é a abreviação da expressão “costume play”). É praticamente uma “festa a fantasia” a céu aberto.

Artistas famosos como Johnny Depp, Cameron Dias, Natalie Portman e Robert Downey Jr são algumas das “figurinhas fáceis” encontradas nestes festivais, promovendo os seus trabalhos, ou mesmo só curtindo o festival, pois não é preciso ser “geek”, nem mesmo “nerd”, para curtir o divertido evento, basta se “deixar levar” e voltar à infância...afinal, quem nunca foi criança um dia??!!




Comic con: o mundo da BD” é um filme, realizado em 2011, por Morgan Spurlock (aquele do Super Size me”, da dieta do palhaço Ronald McDonalds), sobre o que é considerado o maior festival de cultura pop do mundo”, e a película, em forma de documentário, acompanha alguns fanáticos por filmes, séries e BDs (seja aspirantes a um lugar ao sol” no mundo da arte em quadrinhos, seja estilistas envolvidos com a produção das fantasias e dos concursos dos melhores cosplayers”), numa tentativa de demonstrar a importância da convenção no percurso da vida de cada um deles.



Já um curta-metragem é um filme de pequena duração, que em geral dura de 10 a 20 min, incluindo os créditos, segundo as regras da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas dos EUA” (cujo prêmio anual de cinema é o famoso Oscar). 

O gênero que mais utiliza este formato cinematográfico é a animação, mas também é muito usado em documentários e em filmes de estudantes de cinema e publicidade. Por conta disso, a academia americana criou dois prêmios distintos para esta categoria: o Oscar de melhor curta de animação e o Oscar de melhor curta metragem live action

Quem vem se firmando no mercado de curtas de animação é a Pixar Estúdios que, desde a estréia de Toy Story nos cinemas, vem cultivando o hábito de exibir um curta antes de cada novo longa-metragem do grupo.

“Day and Night” foi um dos cinco concorrentes ao Oscar de melhor curta de animação de 2011 (mas a Pixar não venceu), que retrata o embate das personagens o dia e a noite. 

dia mostra toda a sua graça e luminosidade solar, ao som da música Desafinado”, do nosso célebre compositor Tom Jobim, na voz do nosso eterno bossa nova João Gilberto, ambos reconhecidos internacionalmente (e ainda insistem em dizer que funk e sertanejo universitário têm vez no exterior, só se for na boca de jogadores semi-analfabetos e aculturados como os nossos e em programinhas de auditório tão chulos quanto os daqui), enquanto a noite” tenta provar que tem mais a oferecer com a sua magia e suas estrelas.

Um páreo duro, até que os dois descobrem o crepúsculo, misturando o dia com a noite em todo o seu esplendor, e dia se transforma em noite e vice-versa. 

Uma graça este curta-metragem, um aprendizado sobre como lidar com as diferenças, muito bem metaforizadas entre o dia e a noite, e um ensinamento de como dar valor às pequenas coisas boas da vida.


La Luna”, também da Pixar, concorreu ao Oscar de 2012 (mas não levou) e a animação mostra como uma criança, com sua criatividade e inocência pode vencer a discórdia entre adultos e tornar o mundo mais belo e mais harmonioso.



O divertido “The Chubbchubbs”, da Sony Pictures, levou o Oscar de 2003 e se passa numa galáxia distante, com várias referências ao cinema, homenageando magistralmente a sétima e outras artes afins – um bar onde os clientes são, nada mais nada menos, que “Alien, o 8º passageiro” tomando umas e outras, o robô de “Perdidos no espaço” (Lost in space) dançando com uma companheira também robótica, enquanto “Mr Yoda” disputa uma queda de braço com “Darth Vader”, até que o próprio “Jar-Jar” (também de “Star Wars”) vem avisar que “os temíveis Chubbchubbs” estão chegando (e o E.T.”, de Steven Spielberg, é um dos que foge, levado na cestinha da famosa bicicleta).

Mas não dá para falar mais nada, pois contém spoiler” (revelações do enredo) e assim vai estragar o suspense e a surpresa final. Assista abaixo e divirta-se. É imperdível (e não perca, depois dos créditos finais, tem karaokê com os “Chubbchubbs, ao som de Respect”, de Otis Redding e de Why can't we be friends?”, da banda War). 




La Maison en petit cubes é um curta-metragem japonês, que levou o Oscar de 2008, e conta a história de um velhinho que vive, desde a infância, numa cidade eternamente inundada, e a cada subida do nível de água, quando a casa novamente começa a ser inundada, constrói-se outra casa, pacientemente tijolo por tijolo, uma em cima da outra a cada nova inundação (numa bela metáfora sobre como vamos nos adaptando e/ou vencendo os inúmeros obstáculos que a  vida nos proporciona). 

Vivendo sozinho na casa, um dia , ao deixar cair o cachimbo na água, o velhinho coloca o seu escafandro e mergulha para tentar recuperá-lo e ao descer vai recordando seu passado, de casa em casa, sua infância, seu casamento, seus filhos. 

A animação, que não tem falas, apenas uma singela música incidental e o suave barulho do mar e das gaivotas, é uma bela e triste metáfora do claustro e da solidão que a velhice traz, levando os nossos entes queridos, e nos deixando à deriva, à nossa própria sorte, apenas com nossas saudosas recordações.


São muitos os belos curtas, não dá para falar nem da décima parte deles. Deixo a lembrança. na categoria Live action”, do belo curta brasileiro (que venceu um concurso internacional do “youtube” em 2007), intitulado “Laços” (escrito e produzido pela então estudante de cinema, Flávia Lacerda, hoje atriz e comediante), que mostra a tocante história da jovem adolescente que precisa encarar precocemente fatos dolorosos da vida, e se surpreende (e nós também) com a ajuda inesperada de um aparente desconhecido que, de repente, surge à sua frente.




E para finalizar este meu texto, deixo mais um curta divertido da Pixar Estúdios, Oscar de 2002, Coisas de pássaros? (título original For the birds), mostrando que muitas vezes o feitiço se volta contra o feiticeiro(kkk), metaforizando (através do comportamento dos pássaros) o egoísmo e a falta de alteridade das pessoas. 

E da próxima vez que não tiver nada para fazer, siga a dica, é muito, muito, mas muito melhor que novela, futebol ou BBB. Nem se compara.

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